Demais ou de mais: fácil demais!

rita lee

“Como vai? Tudo bem
Apesar, contudo, todavia, mas, porém
As águas vão rolar, não vou chorar
Se por acaso morrer do coração
É sinal que amei demais”  Rita Lee – Saúde

Demais funciona como advérbio de intensidade. E os advérbios relacionam-se com verbo, adjetivo ou outro advérbio. No caso da letra de música acima, demais intensifica o sentido do verbo amei: “Amei demais”. Já no título da postagem, demais valoriza o adjetivo fácil: “Fácil demais!”

Outros exemplos:

Aquela roqueira canta demais (relação com o verbo cantar)
O ingresso era barato demais (relação com o adjetivo barato)
Os fãs chegaram tarde demais (relação com o advérbio de tempo tarde)

de mais é uma locução adjetiva e se opõe à expressão de menos. Relaciona-se com substantivos (em alguns casos, subentendidos) e com pronomes.

No festival, havia espectadores de mais e banheiros de menos.
Naquela escola, os professores têm obrigações de mais; os diretores, de menos.
Os bancos têm de mais; o trabalhador, de menos (substantivo “dinheiro” subentendido na oração).

Perceba que espectadores, obrigações e dinheiro são substantivos e, portanto, não podem ser acompanhados pelo advérbio demais, mas sim pela locução adjetiva de mais.

Exemplos com pronomes: alguém, algo, ninguém, tudo, cada, quem, nada etc.

Não vejo nada de mais em fazer topless.
Tudo de mais, enjoa.

Nada e tudo são pronomes. Não é verbo, adjetivo ou advérbio.

Para desfazer confusões, é sempre bom usar a lógica. Não há sentido dizermos “canta de menos”, “barato de menos” ou “tarde de menos”. Certo? Então, se ao opor as expressões, elas se tornarem absurdas, já sabe qual “demais” usar… 😉
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Outros casos:

Demais como adjetivo = outros
Só Valéria ficou chateada por não entrar no show, os demais fãs nem ligaram (ligado ao substantivo fãs).

Demais como pronome indefinido = o(s) restante(s), os outros
Esses ingressos são meus, eu ganhei! Quanto aos demais, que comprem.

Demais como conjunção explicativa = ademais, além disso
Chegou atrasado ao espetáculo; demais, o carro quebrou.
– ademais, o carro quebrou –
– além disso, o carro quebrou –

Qualquer informação a mais que precise, pode me contatar em
valeriavianna@amigadaletra.com ou no facebook

 

 

 

 

 

 

 

 

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Precisão é preciso para comunicar melhor

UBALDO

Certa é a frase que, obedecidos o espírito da língua e as circunstâncias
do discurso, comunique com a precisão possível, pronto.
                                                                                     João Ubaldo Ribeiro   

Quantas vezes não acontece de pararmos de escrever um texto para procurarmos na memória aquela palavra que vai dizer exatamente o que queremos dizer?  A gente pergunta ao colega do lado… se estivermos sozinhos, vamos ficar pensando… tentando lembrar…

Sabe o que é isso? Isso é a nossa busca pela precisão.

Porque precisão é tudo, gente. Trata-se de uma condição fundamental para atingirmos uma linguagem clara, nítida. É o que nos demanda tempo diante da tela do computador, esperando vir à mente a tal palavra que melhor traduza o que pretendemos comunicar.

Bom, para isso, existem os dicionários. E, com os aplicativos de celulares, ficou ainda mais fácil consultá-los. Quer um conselho? Consulte sempre e mais o dicionário. Adquira esse hábito e você verá como a leitura e, principalmente, a escrita, ficará cada dia mais fácil.

O poeta Mário Quintana mesmo dizia que, nesta vida, só deveríamos dedicar nosso tempo a ler poesia e dicionário. Não é à toa que gosto tanto dele. Sábio…

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Onde você nunca deve usar crase

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Sílabas

Sento-me à máquina. Datilografo.
Vacilam-me nos dedos as teclas.
Desalinhadas enfileiram-se as letras.
É angústia da minha velha máquina
ou será da fita gasta?
É que na limpidez do papel
Sobressaem nubladas
Cinco letras:
Maria.
              Craveirinha – poeta africano

 

Nosso querido Craveirinha escolheu usar o acento grave indicativo de crase porque à máquina é uma expressão adverbial feminina de instrumento. Seu uso, no entanto, só é facultativo quando for para evitar ambiguidade, como no caso de Lavei a maquina (lavou a sujeira da máquina) e Lavei à máquina (lavou a roupa na máquina).

Mas nunca devemos utilizar a crase nos seguintes casos:

  • Antes de masculino – Fui ao cinema a pé;
  • Antes de verbo – Estou apta a começar;
  • Antes de pronomes em geral – Não me referi a ela;
  • Expressões repetidas – Ficamos cara a cara;
  • Antes de nomes de cidades – Fiz uma viagem a Roma (mas se o nome da cidade estiver determinado, então ocorre: Fiz uma viagem à Roma antiga);
  • Quando um “a” (sem o s de plural) vier antes de um nome plural – Não falo a pessoas estranhas (havendo o s de plural, naturalmente utilizamos crase, porque é sinal da presença do artigo feminino plural “as” antes da palavra pessoas: Não falo às pessoas estranhas).

Lembrando que crase é a fusão de dois “as”: a + a.

No caso de Não falo às pessoas estranhas, temos a preposição pedida pelo verbo falar – falo a – mais o artigo feminino plural precedendo o nome pessoas – as pessoas. Então, fica assim: não falo a + as pessoas – Não falo às pessoas estranhas – (a + as = crase: às)

Já em Não falo a pessoas estranhas, temos a preposição “a” pedida pelo verbo falar, mas não o artigo feminino plural “as” antes do substantivo pessoas – (a + … = sem crase: a).

Eu ainda volto a falar de crase em outra postagem, beleza?
Beijo e boa sorte. 🙂

 

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Reaver ou devolve a poesia, Deus

adélia

“De vez em quando Deus me tira a poesia.
Olho pedra, vejo pedra mesmo.”
Adélia Prado – Poesia Reunida

Bom, enquanto nossa querida Adélia busca reaver sua poesia, nós seguimos aqui com esse verbo derivado do haver.

Quando eu era estudante, encasquetava com o fato de o verbo reaver ser chamado de defectivo. Imaginava, lá com meus botões e pelo jeito da palavra, que ele devia vir com algum defeito de fábrica. E não é que, na intuição, eu estava certa? Defectivo significa defeituoso, que não é perfeito. Pode conferir no Aurélio.

Aliás, nunca faça como eu fiz de ficar deduzindo. As palavras, muitas vezes, enganam a gente. Na dúvida ou não sabendo, confira no dicionário e veja se pedra é pedra mesmo. Ou se defectivo é defeito. Combinado? Conselho de Mário Quintana, não é pouco, não.

Pois, então. Como o verbo reaver tem esse defeitinho de fábrica, só se conjuga nas formas em que o verbo haver conserva a letra “v”, primeira e segunda pessoas do plural do presente do indicativo, por exemplo:

Presente do indicativo
Eu hei
Tu hás
Ele há
Nós havemos – nós reavemos (1ª pessoa do plural)
Vós haveis – vós reaveis (2ª pessoa do plural)
Eles hão

Ele também não existe no presente do subjuntivo e no imperativo negativo.
No imperativo afirmativo, por sua vez, somente na segunda pessoa do plural.

Presente do subjuntivo        
que eu haja
que tu hajas
que ele/ela haja
que nós hajamos
que vós hajais
que eles/elas hajam

Imperativo negativo
não hajas tu
não haja ele/ela
não hajamos nós
não hajais vós
não hajam eles/elas

Imperativo afirmativo
há tu
haja ele/ela
hajamos nós
havei vós    – reavei vós (2ª pessoa do plural)
hajam eles/elas

Beleza?
Beijo e boa sorte. 😉

 

Aspirar, visar, assistir: atenção nesses verbos

cecilia-meireles

“Não faças de ti
Um sonho a realizar.
Vai.
Sem caminho marcado.
Tu és o de todos os caminhos”
Cecília MeirelesCânticos

Vai, meu amigo, aspirar aos seus sonhos, visar às alegrias cotidianas. Assistir ao sucesso do irmão.

Bem sabemos que criaturas que não conseguem sonhar ou correr atrás das alegrias cotidianas e aí, por recalque, desejam mesmo é o fracasso do irmão. Eu tenho uma amiga super católica que reza para essas pessoas. Mas, eu… confesso, ainda não atingi esse alto grau de espiritualidade.

Oremos. :-/

Como não sou de toda má (ninguém é), sei me alegrar com a alegria e o sucesso do outro. Mesmo! Desse mal não morro. Nem vem.

Muda o rumo dessa prosa, poxa!

É, né? Porque o que eu queria mesmo era falar dos verbos aspirar, visar e assistir. Vamos, lá? Os três são transitivos indiretos porque pedem a preposição a. Mas nem sempre pedem. Vai depender do sentido. Veja:

Aspirar no sentido de almejar (indireto, pede preposição)
Aspiramos a uma vaga na faculdade

Mas:

Aspirar no sentido de sorver o ar (direto, não pede preposição)
Aspiramos o ar puro da serra
………………………………………………………………………..

Visar no sentido de ter em vista (indireto, pede preposição)
Não viso a essa condição social

Mas:

Visar no sentido de apontar arma (direto, não pede preposição)
O atirador visou o alvo
ou
Visar no sentido de passar visto (direto, não pede preposição)
O gerente do banco visou o cheque
………………………………………………………………………….

Assistir no sentido de presenciar (indireto, pede preposição)
Assistimos a uma peça teatral
e
Assistir no sentido de caber, competir (indireto, pede preposição)
Esta função sintática não assiste ao advérbio

Mas:

#Assistir no sentido de ajudar, dar assistência (direto, não pede preposição)
O médico assistiu o doente

#a forma sem preposição é a mais aceita,
mas com preposição também é correta – assistiu ao doente.
…………………………………………………………………………..

Fique esperto!
Geralmente os verbos transitivos indiretos aceitam os pronomes oblíquos átonos lhe, lhes como complementos. Mas esse não é o caso dos nossos amigos aspirar no sentido de almejar, visar no sentido de ter em vista e assistir no sentido de presenciar. Eles são birrentos e só aceitam as formas tônicas a ele, a ela, a eles, a elas.

Exemplo:

– Aspiras ao teu sonho?
– Aspiro, sim. Aspiro a ele. (E não aspiro-lhe, essa construção não existe)

– Visa às alegrias cotidianas?
– Naturalmente! Viso a elas. (E não viso-lhes, essa construção não existe)

– E, ao sucesso do meu irmão, assisti a ele com alegria. (E não assisti-lhe)

Por conta disso, nenhum dos três admite a voz passiva e as frases abaixo estão erradas:

O espetáculo foi assistido por mim
Uma vaga de emprego é aspirada por todos
A fama é visada pelo ator

O certo é:

  • Eu assisti ao espetáculo
  • Todos aspiram a uma vaga de emprego
  • O ator visa à fama

Beleza?
Beijo e boa sorte. 🙂

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Meu namoro com o verbo haver

Guimarães Rosa

(…) “passarinho que se debruça – o voo já está pronto!”
Guimarães RosaGrande Sertão: Veredas

O mesmo se dá quando estamos diante da tela em branco do computador para escrever. Como o passarinho que, ao se debruçar, o voo já está pronto, o nosso discurso também está prontinho para acontecer. Porque palavras doidas para nascer e virar texto. E nós temos palavras de sobra em nossas cabeças: ô, se temos!

Quando eu cursava o ensino fundamental e pensava tanto em namorar quanto em pensar português, vez ou outra nas provas vinha a dúvida sobre se o verbo haver ia ou não para o plural. E claro que a dúvida sobre o verbo haver costumava vir junta e misturada às minhas dúvidas sobre se o André Luiz estava a fim de mim ou não.

Não estava. 😦

Tudo bem, passou. Sigamos.

Então, o verbo haver é impessoal (sem sujeito), não é a fim de namorar – prefere ficar na dele – quando vem na frase com o sentido de existir, acontecer ou de tempo passado:

Há palavras doidas (existem palavras doidas).
Há muitos anos que não vejo André Luiz (passou foi tempo, viu?)
Haverá muitas festas este ano (acontecerão muitas festas).

Mas se o sentido não for de existir, acontecer ou tempo passado, nas locuções verbais (mais de um verbo: auxiliar e principal) rola um namoro e ele passa a ser pessoal (com sujeito):

Haviam acendido as luzes.
Haviam consertado a lâmpada.

Mas não só nas locuções.
Quer ver outros exemplos em que ele é pessoal?

Haver no sentido de “obter”:
Houveram da professora a permissão para sair (obtiveram da professora).

Haver no sentido de “considerar”:
Nós o havemos um excelente diretor (nós o consideramos)

Haver no sentido de “comportar-se”:
Os convidados se houveram com educação na cerimônia (se comportaram bem)

Haver no sentido de “lidar”:
Os novos inspetores houveram bem com as turmas (lidaram bem).

De qualquer forma, tendo guardado na cabeça que o verbo haver não namora no sentido de existir, acontecer ou tempo passado, não haverá erros! Ou não acontecerão erros.

Beleza?
Beijo e boa sorte. 😉

 

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